Lista de leituras sobre IA na Educação
Uma seleção de fontes de qualidade sobre IA no contexto educacional, equilibrando reflexão teórica e aplicação prática

Bem-vindos a mais uma edição da IAEdPraxis, sua fonte de informação para explorar os caminhos da Inteligência Artificial aplicada à Educação. Depois de muitos textos falando sobre escrita na era da IA, o tema agora é leitura!
Para alguém se manter atualizado num tema relativamente novo (e na “moda”) como a Inteligência Artificial na Educação, um duplo esforço é necessário. Por um lado, navegar por um número crescente de notícias, artigos, posts de redes sociais, guias e normativas.
Por outro, identificar - tanto em termos práticos, como teóricos - aquelas fonts de informação com efetiva capacidade de contribuir para a reflexão sobre as implicações pedagógicas e éticas da IA
Dessa forma, compartilho aqui uma seleção de minhas leituras, sejam elas já realizadas, em andamento ou de caráter contínuo. São textos que têm me ajudado a desenvolver meu conhecimento neste campo dinâmico e espero que sejam úteis para você também.
Livros
Co-intelligence: living and working with AI
Ethan Mollick
Portfolio, 2024
Citado várias vezes aqui na newsletter, o livro de Ethan Mollick não se restringe à Educação e está pensado como uma obra de divulgação sobre o poder e impacto da IA sobre nossa de viver e trabalhar. Tem um “quê” de deslumbre, algo que faz com que este professor e pesquisador seja mal visto por setores da academia. Além disso, está um tanto datado em relação aos desenvolvimentos tecnológicos, publicado quando o ChatGPT ainda era novidade. Entretanto, como acadêmico, Mollick é capaz de identificar alguns princípios gerais que devem permanecer constantes na discussão, como a perspectiva de colaboração humano-máquina, questões de autonomia, responsabilidade compartilhada e redefinição de habilidades humanas na era da automação cognitiva.
As decisões de hoje sobre como a IA reflete valores humanos e aprimora o potencial humano repercutirão por gerações. Este não é um desafio que possa ser resolvido em um laboratório — requer que a sociedade lide com a tecnologia que está moldando a condição humana e com o futuro que queremos criar. E esse processo precisa acontecer logo.
Estudos sociopolíticos da Inteligência Artificial
Sylvia Iasulaitis, Sergio Amadeu da Silveira
EDUEPB, 2025
Obra nascida da tradição da análise crítica da economia baseada em dados e do capitalismo digital, agora aplicados ao novo campo dos “Estudos Sociopolíticos da Inteligência Artificial”. Entre os temas explorados, as subjetividades algorítmicas - incluindo o viés racial e o capacitismo -, a historiografia da IA,a plataformização da ciência e o colonialismo digital. Com viés sociológico, característico de um dos organizadores da obra, professor Sergio Amadeu, estabelece um contraponto necessário ao tecnosolucionismo e à tecnofilia ingênua que frequentemente caracteriza o discurso sobre a IA na educação. Obra de acesso livre.
A Inteligência Artificial implica em alterações significativas em diversos aspectos da vida social, mas não propicia a criação de novas respostas a velhas perguntas e sim a emergência de novas perguntas.
Generative AI and Education: digital pedagogies, teaching innovation and learning design
B. Mairéad Pratschke
Springer, 2024
As credenciais da autora, professora da Universidade de Manchester, da qualidade da editora e os temas abordados apontam tanto para uma fundamentação sólida como para um olhar rejuvenescido sobre o uso da IA na Educação. Após uma introdução sobre as características da tecnologia e sobre seu seu ecossistema de atuação, o livro foca no “novo híbrido” como forma de atuação, no “generativismo” enquanto teoria epistemológica e nas “comunidades inteligentes” como perspectiva de futuro. Um capítulo final é dedicado ao “nó” que temos abordado através dos desafios da escrita e da avaliação automatizadas, isto é, a avaliação.
Os estudantes que trabalham com IA Generativa precisam desenvolver sua capacidade de dar sentido ao que ela produz e localizá-la dentro de contextos mais amplos, vendo-a como um oponente crítico disfarçado de assistente bajulador e trabalhando com ela a partir de uma posição de consciência crítica. Esta é a essência da aprendizagem centrada no humano com IA Generativa.
Teaching with AI: a practical guide to a new era of human learning
José Antonio Bowen, C. Edward Watson
Johns Hopkins University Press, 2024
Anunciado como um guia prático para educadores navegarem o impacto “transformador” da IA na Educação, aborda temas como técnicas interativas, estratégias de avaliação, além da questão do plágio e da integridade acadêmica. Como tese central, defende que, na era da automação cognitiva, o pensamento crítico, a alfabetização informacional e a formação humanística tornam-se ainda mais necessárias.
Toda essa nova reflexão [sobre temas como ética, privacidade de dados, educação cívica, custos ambientais e energéticos, trabalho, discriminação e viés] será realizado com a IA. A educação, a parentalidade e a democracia sempre administraram uma tensão incômoda entre o que pensar (conteúdo) e como pensar (processo). À medida que a internet proporcionou acesso mais imediato ao conteúdo, ela mudou profundamente esse equilíbrio para o processo. Nosso novo futuro é ensinar os estudantes como pensar com a IA.
Creative applications of Artificial Intelligence in Education
Alex Urmeneta, Margarida Romero
Palgrave Macmillan, 2024
Embora adote uma postura um tanto “integrada”, destacando o potencial de transformação e enfatizando a personalização da experiência de aprendizagem, faz um esforço para fechar a lacuna entre promessas e caminhos práticos e tangíveis. A co-criatividade humano-máquina, em diferentes áreas (formação docente, educação profissional, negócios), através de diversas ferramentas (jogos, chatbots, avaliação assistida) é complementada por considerações sobre a ética, implicações políticas e o papel central dos educadores no processo educativo.
Dada a falta de instruções concretas sobre como ser criativo, como então devemos considerar o processo de criatividade humana em relação aos sistemas de IA e conceitos associados como criatividade computacional?
Teaching and Generative AI: pedagogical possibilities and productive tensions
Beth Buyserie, Travis N. Thurston
Utah State University, 2024
Oferece uma visão equilibrada, sem cair no deslumbramento tecnológico ou na rejeição completa, os autores exploram tanto as possibilidades quanto as tensões produtivas que emergem desta relação. Propõe uma abordagem interdisciplinar, fornecendo recursos pedagógicos práticos para educadores, bibliotecários e designers instrucionais navegarem os desafios trazidos pela IA. Entretanto, há um desbalanço na profundidade de tratamento e profundidade das contribuições individuais. Acesso livre.
Embora o trabalho de Freire [Paulo] obviamente preceda plataformas de IA aberta como o ChatGPT, seu argumento ainda ressoa em nossa era de IA: suprimir o pensamento crítico limita a autonomia de nossos alunos e, em última análise, os desumaniza, ou oprime. Como professores nesta era da IA, é essencial capacitar os aprendizes—incluindo professores como aprendizes—para pensar criticamente e apoiar uns aos outros como agentes de nossa própria educação, promovendo assim nosso desenvolvimento e, em última análise, nossa humanização.
Carta de Recomendação para o uso da Inteligência Artificial na Educação: desafios e potencialidades
Nelpa, 2025
“Recém saída do forno” e fruto da iniciativa do Grupo de Trabalho Educação da Cátedra Oscar Sala (IEA-USP), a Carta aborda tanto as oportunidades quanto os desafios emergentes, buscando preencher a lacuna de conhecimento entre profissionais da Educação sobre IA, especialmente no contexto brasileiro. Para cada um dos nove desafios identificados (acirramento das exclusões, lacuna na formação docente, geração e aprofundamento da desinformação, etc.), são propostas recomendações, de caráter prático.
Assim, o desafio que se apresenta [promover o pleno desenvolvimento do indivíduo, prepará-lo para o exercício da cidadania e para o mundo do trabalho] não é apenas assegurar que esse objetivo seja alcançado, mas também aproveitar as oportunidades oferecidas pelas tecnologias digitais para concretizar uma educação de qualidade
social para todos em um Brasil que se almeja democrático, justo e equitativo.
Mitos EdTech: desmontando el solucionismo tecnológico en Educación
, Juliana Raffaghelli, Pablo Rivera-VargasPropõe-se abordar criticamente a relação entre Educação e tecnologia a partir de uma perspectiva humanística e interdisciplinar, desmontando nove narrativas falaciosas . Embora não seja específico sobre Inteligência Artificial, o texto tangencia a mitologia recorrente no discurso contemporâneo, revelando uma visão frequentemente limitada da tecnologia educacional, que prioriza as aplicações econômicas e seus benefícios em detrimento do valor pedagógico.
Na atualidade, o solucionismo tecnológico educativo se move orientado à automatização da docência e ao controle dos processos de aprendizagem, a partir de dispositivos cada vez mais “inteligentes”. Embora o componente tecnológico pareça mudar continuamente, levando-nos à pós-digitalidade, a narrativa educativa que se tece em torno ao desenvolvimento digital se apresenta constante, desencadeando entusiasmos e corridas em relação ao uso de um ou outro dispositivo. Por isso, ao usar a tecnologia, também participamos de visões sobre seu poder na educação.
Assim, longe de estimar e estimular uma apropriação significativa do digital, uma visão educativa apoiada em mitos gera um empobrecimento da educação mediada com essa tecnologia. Existe, portanto, a necessidade de desmontar e esclarecer os mitos da educação digital como campo de estudo e reflexão da pedagogia digital crítica que hoje se encontra em pleno desenvolvimento.
Guias
AI Competency Framework for students
Fengchun Miao e outros
UNESCO, 2024
Quadro de referência que tem como objetivo orientar formuladores de políticas, educadores e desenvolvedores de currículos na preparação dos estudantes para interagir com a IA. Estruturado em quatro competências principais: mentalidade centrada no humano e sua agência; ética, uso responsável e práticas seguras; técnicas e aplicações e design de sistemas de IA, conclui pela competência de resolução de problemas e fomento do pensamento criativo. A recomendação para promover a competência em IA é integrá-la às disciplinas básicas.
AI Competency Framework for teachers
Fengchun Miao e outros
UNESCO, 2024
Análogo ao anterior, mas com foco na docência. Busca orientar a formação contínua de educadores, oferecendo um referencial para programas governamentais. As áreas de competências são similares, mas agora incluindo a pedagogia com IA e a aprendizagem contínua. Enfatiza o papel complementar, não o de substituição dos professores no processo educativo.
Newsletters e publicações
One Useful Thing - Ethan Mollick
Estabelecido como voz influente no campo da IA e produtividade, o trabalho de Ethan Mollick é conhecido pelas implicações práticas da IA Generativa no trabalho e Educação. Análises equilibradas, sempre testando os modelos de ponta, com rigor acadêmico e aplicação prática
Para usar a IA com sucesso, as organizações precisarão mudar suas analogias. Nossos achados sugerem que a IA às vezes funciona mais como um companheiro de equipe do que como ferramenta. Embora não seja humana, ela replica os benefícios essenciais do trabalho em equipe — desempenho aprimorado, compartilhamento de expertise e experiências emocionais positivas […] Pelo menos com o conjunto atual de ferramentas de IA, a IA aumenta as capacidades humanas.
Leon Furze
O blog do consultor, autor e palestrante, atualmente fazendo seu doutorado sobre as implicações da IA Generativa no ensino-aprendizagem da escrita traz reflexões interessantes. Posicionando-se “sobre o muro” (over the fence, no original), transita entre aplicações e experimentações práticas e uma visão mais crítica da tecnologia.
Estou interessado em desmistificar a IA Generativa, em remover a linguagem “mágica” associada à tecnologia e encorajar as pessoas a tratá-la como software – porque é isso que ela é. Os desenvolvedores de tecnologia gostariam que acreditássemos que a IA é um companheiro, uma colega, um professor, até mesmo um amante. No futuro (muito) próximo, algumas pessoas experimentarão a IA dessas maneiras – já estão experimentando. Mas isso não significa que nós [professores], individualmente, não tenhamos direito às nossas próprias opiniões.
AI+Edu=Simplified
A newsletter do professor Lance Eaton tem a “esperança de simplificar e clarificar o que fazer em seguida”, no que diz respeito à IA Generativa no Ensino Superior. Embora não esteja sendo atualizada, o arquivo é valioso, a exemplo da discussão sobre integridade acadêmica e “plágio de IA” e sobre políticas institucionais de uso.
Uma coisa que aprendi nos últimos dois anos é que políticas não são apenas sobre a política em si, mas sobre a percepção. Ter uma política importa porque comunica aos estudantes e aos professores que a instituição tem alguma atenção e consciência sobre isso. Uma política indica consciência, mas também compromisso, de forma que elaborar e esclarecer algum tipo de mecanismo para abordar a mudança tecnológica comunica que esse compromisso é contínuo.
Rethorica - Mark Watkins
Outro acadêmico, professor de escrita e retórica na Universidade do Mississippi. Seu foco é o letramento em IA, incluindo reflexões sobre leitura no tempo da mídia digital, os custos da tecnologia nas instituições educacionais, a geração “chatbot”…
Seria sábio desenvolvermos um vocabulário cuidadoso para discutir a IA generativa — um que reconheça tanto suas capacidades quanto limitações, sem depender de analogias humanas. Em vez de traços de raciocínio, falar de caminhos de predição. Ao invés de alucinações, chamar de erros. Não se trata apenas de preciosismo semântico; é sobre construir uma estrutura que nos permita ver essas ferramentas pelo que elas verdadeiramente são.
Dr Phil’s Newsletter, Powered by DOMS™️ AI
A newsletter da doutora Philippa Hardman se dispõe a conectar a "ciência da aprendizagem com AI com a arte do design de experiências de aprendizagem. Apresenta posições e debates bem fundamentados em pesquisa.
Para deixar claro: a IA agêntica não destruiu o aprendizado online; ela revelou sistemas que já estavam falidos há décadas. O caminho a seguir não é retornar às salas de aula ou criar novas punições para quem usa agentes de IA para concluir cursos. Pelo contrário, o futuro está em redesenhar o aprendizado online, focando na aplicação prática de habilidades, avaliação autêntica de competências e reforço constante. Isso implica superar os modelos estáticos e centrados em conteúdo, avançando para ecossistemas de aprendizado alimentados por IA e integrados ao dia a dia profissional.
Critical AI
Revista acadêmica interdisciplinar, com raízes nos métodos críticos das Humanidades, Ciências Sociais e Artes. Propõe que a tecnologia possa ser responsabilizada em temas como princípios de justiça social, decolonialidade, anti-racismo, pedagogias experimentais, etc. Alguns artigos são de acesso livre, a maioria somente pode ser acessada por assinatura ou compra individual. O perfil em rede social, entretanto, compartilha prévias que podem ser acessadas livremente.
O hype sobre IA hoje tem, portanto, notavelmente duas faces como Janus: imersa em linguagens utópicas e distópicas, assim como em peculiares misturas das duas. No entanto, o que tais discursos compartilham é a tendência de minimizar os danos reais no mundo causados pelas tecnologias realmente existentes.
Redes sociais
Ana Mills
Voz ativa na integração da Inteligência Artificial na Educação, demonstra compromisso com recursos educacionais abertos, compartilhando suas produções e recursos didáticos. Focada em letramento em IA, integridade acadêmica e aplicações de IA no Ensino Superior, une abordagens críticas com experimentações. Alega ter sido a única especialista educacional recrutada para testar o GPT-4 antes de seu lançamento .
Se você é um educador que acredita em atribuir trabalhos de escrita, sem dúvida tem pensado sobre IA. Muitos de nós estamos explorando se e como convidar os alunos a usar IA no processo, considerando maneiras pelas quais a IA pode estimular o pensamento, mas também preocupados que ela possa atrapalhar as habilidades de escrita e a confiança dos alunos em sua voz e julgamento.
Cristobal Cobo
Reconhecido palestrante e autor sobre temas relacionados ao uso de novas tecnologias na educação em todo o mundo, tendo dedicado 20 anos de trabalho na interseção entre o futuro da aprendizagem, culturas de inovação e tecnologias centradas no ser humano. Consultor para diversos programas educacionais na América Latina, divulga os resultados de pesquisas sobre uso da IA, além de uma grande variedade de publicações técnicas, manuais, guias, etc.
Para navegar com segurança a adoção da IA generativa na educação e mitigar os riscos associados, especialistas argumentam e enfatizam a importância de fomentar a “fluência em IA” - competências robustas para compreender criticamente, avaliar e aplicar eticamente os sistemas de IA em todas as camadas da sociedade.
Neil Selwyn
Pesquisador de referência na integração de tecnologias digitais em escolas, universidades e educação de adultos, conhecido por sua postura “pé atrás”. Com foco nas limitações e problemas “do mundo real” enfrentados durante a implementação da tecnologia educacional, tem dedicado bastante atenção a como a IA poderá transformar o trabalho docente. Atualmente é o anfitrião do podcast Education Technology Society.
Eu estive em algumas discussões recentemente onde as pessoas genuinamente não conseguem ver como a IA Generativa pode levar os professores a fazerem mais trabalho (ao invés de menos trabalho). É interessante olhar para a história de outras tecnologias “poupadoras de trabalho” - especialmente o trabalho de Ruth Schwartz Cowan sobre tecnologias domésticas e o trabalho doméstico das mulheres…Eu acho que pode haver paralelos?!
Faltou alguém? Sugestões?